Não se vê no canavial
nenhuma planta com nome,
nenhuma planta maria,
planta com nome de homem.
É anônimo o canavial,
sem feições, como a campina;
é como um mar sem navios,
papel em branco de escrita.
É como um grande lençol
sem dobras e sem bainha;
penugem de moça ao sol,
roupa lavada estendida.
Contudo há no canavial
oculta fisionomia:
como em pulso de relógio
há possível melodia,
ou como de um avião
a paisagem se organiza,
ou há finos desenhos nas
pedras da praça vazia.
Se venta no canavial
estendido sob o sol
seu tecido inanimado
faz-se sensível lençol,
se muda em bandeira viva,
de cor verde sobre verde,
com estrelas verdes que
no verde nascem, se perdem.
Não lembra o canavial
então, as praças vazias:
não tem, como têm as pedras,
disciplina de milícias.
É solta sua simetria:
como a das ondas na areia
ou as ondas da multidão
lutando na praça cheia.
Então, é da praça cheia
que o canavial é a imagem:
vêem-se as mesmas correntes
que se fazem e desfazem,
voragens que se desatam,
redemoinhos iguais,
estrelas iguais àquelas
que o povo na praça faz.
THE WIND IN THE CANEFIELD
There is in the canefield
no plant with a name,
no plant called Maria,
no plant with a man´s name.
The canefield is anonymous,
plain-faced like the prairie,
like an ocean without ships,
a blank sheet of paper.
It is like a large bedsheet,
seamless and creaseless, a girl´s
downy skin in the sunlight,
cloths spread out to dry.
Yet hidden in the canefield
there is a physiognomy,
as in a watch´s ticking
there is a potential melody,
as from a plane the landscape
reveals an organization,
as bricks in an empty plaza
can trace a graceful pattern.
The canefield stretched out
under the sun, an inanimate
fabric, becomes a feeling
sheet when the wind is blowing;
It changes into a living
flag of green on green,
with green stars born
and lost in the greenness.
The canefield then no longer
resembles empty plazas:
it does not have, like stones,
the discipline of armies.
Its symmetry is jagged,
like that of waves of people
vying in the crowded plaza.
Yes, the teeming plaza
is what the canefield mirrors
with its currents that likewise
arise and subside —
Undercurrrents which, surging,
make whirlpools like the ones
crowds form, stars like those
the people in the plaza compose.
credits
from Engenheiros,
released June 30, 2018
Music by Nando Michelin-Ebinho Cardoso
Poem by João Cabral de Melo Neto
Instrumental music, connecting Arabic, Flamenco, and South American influences. Features Antonio Serrano (Harmonica) and Layth Sidiq (Violin) and Naseem Alatrash (Cello) Nando Michelin & Ebinho Cardoso